À Escola vieram-lhe a chamar Eça de Queirós mas nós, que em Janeiro de 1977 a inaugurámos no meio do lamaçal - data tardia para o início de ano lectivo até nesses tempos revolucionários -, ficámos na trincheira dos Viveiros. Há tempos o já saudoso João Belo lembrou o lendário stôr Roxo, anos a fio presidente do conselho directivo. E então tentei lembrar o plantel dos professores de liceu que por lá tive. Sinal claro da balbúrdia desses tempos, a grande maioria varreu-se-me da memória. Se me recordo dos professores do "ciclo", passado no recato do Valsassina, os anos escolares seguintes estão na bruma. Lembro algumas personagens mas por questões acidentais - uma professora de matemática do 7º porque vizinha, uma de biologia do 9º porque lindíssima, um de português de um ano esquecido porque jovem barbudo e de cerrado sotaque do Porto - ainda assim um gajo porreiro -, quatro ou cinco personagens já meio confundidas porque vítimas privilegiadas das "malvadezas" daquele então. Sem ironia, um tipo olha para trás e vê que se divertiu (como não? se com aquela idade ...) mas por ali passou como por outro sítio qualquer teria passado.
Em seis anos de "ensino secundário" ficou-me o registo de três professores. Desse quase vazio a culpa, se é que isso existe (e um gajo quando passou pela profissão atira menos pedras), não seria de cada um deles mas acima de tudo daquela balbúrdia radical, do desarranjo de tudo aquilo. E também da parvoíce dos infantes, minha e não só, num estado pré-selvagem (como viria a criar o sô Rafael da mercearia ao Pinto, passados alguns anos). Lembro dois excelentes professores de História no 10º e no 11º - um era Aníbal Esteves, ali vizinho, vivendo num prédio que era moradia de uma Vespa Gorda. Do outro esqueci o nome (aqui mea culpa).
Mas ainda assim no meio daqueles Viveiros ainda deu para cruzar o professor que me foi o mais importante na vida. Um puto (teria para aí uns 21 anos) ainda estudante e que ensinava Filosofia. Brilhante, genial nas aulas. A ensinar o pessoal (era aquilo do Belo e dos pré-socráticos e outros gregos assim), a apaixonar as meninas claro, que as colegas andavam suspirosas pelos corredores, e a vir cá para fora ensinar-nos fintas de pés, enganando os candeeiros ali ao café Vitor (para não ser à porta da escola). Depois pôs-nos a dar aulas, "como na Universidade" aliciava ele e nisso não mentia - lá fui com o Miguel A. (Policlínica), com o Pedro P. (ao Tosta) e com o Fac. (Catió) dar uma aula sobre uns helénicos - uma catástrofe que ele aplaudiu. Depois pôs-me a dar uma aula sobre Heraclito, sozinho, preparei-me por aqui - tinha quinze anos! Correu-me bem, acho, acharam. Tínhamos todos aquela idade! Passado algum tempo conversávamos no pátio e ele, até surpreso depois dos testes, "estranho, vocês perceberam melhor o Parménides do que o Heraclito, costuma ser o contrário". "Pois, fui eu que dei a aula do Heraclito", disse até acabrunhado. "Nada disso, v. foi excelente" e eu, puto estúpido, logo a (re)inchar-me. Mas destas ingenuidades todas, até dele, um gajo só percebe quando vai para mais velho. Ao aproximar-se o fim do ano veio avisar, "ninguém chumba comigo" pois "vocês não têm idade para abstrair, só a partir dos dezasseis anos e mesmo assim ..." - platónico, estava-se mesmo a ver, ainda que ele também não tivesse os trinta anos recomendados. E o pessoal ainda assim, ou talvez por isso mesmo, a ir-se aos estudos - não muito, que não era recomendado perder a face de balda, claro. Depois desapareceu.
Dez anos depois, estava eu já doutorzito em entre-tropas, vi anunciada uma conferência do Prof. Nuno Nabais no Goethe. Lá fui eu, a ver o que lhe tinha acontecido. Lembro que entrei e assisti, era qualquer coisa como a presença de Kant em Nietzsche ou similar. Não percebi rigorosamente nada, para além das saudações. E nisso foi tamanha a angústia que me escapuli, a fazer-me esquecido do "dá-me licença ... V. foi meu professor em miudo" que talvez me tivesse levado até ali.
(ok, o post está longo, chato e isso, virá dizer o maitre Fulacunda. Mas apeteceu-me assim. Aguenta-te)
Dez anos depois, estava eu já doutorzito em entre-tropas, vi anunciada uma conferência do Prof. Nuno Nabais no Goethe. Lá fui eu, a ver o que lhe tinha acontecido. Lembro que entrei e assisti, era qualquer coisa como a presença de Kant em Nietzsche ou similar. Não percebi rigorosamente nada, para além das saudações. E nisso foi tamanha a angústia que me escapuli, a fazer-me esquecido do "dá-me licença ... V. foi meu professor em miudo" que talvez me tivesse levado até ali.
(ok, o post está longo, chato e isso, virá dizer o maitre Fulacunda. Mas apeteceu-me assim. Aguenta-te)