JORNADAUM JORNAL FELIZ
NUM PAÍS TRISTE
Parece-me ouvir casquinadas trocistas vindas das gargantas de alguns dos leitores que hoje, por interesse, por curiosidade ou por puro acaso, se depararam nas bancas com este seu novo jornal.
- Ah! Ah! Mais um...
Pois guarde, para já, o seu escárnio, caro leitor. Bem sei que tem motivos para certa desconfiança. Quantos jornais têm nascido e morrido, com e sem história, neste país que o mar não quer, como lhe chamava Ruy Belo.
Mas nós, que nos deitámos à aventureira tarefa de fazer o exemplar que está neste momento nas suas mãos, não acreditamos em fatalidades. Somos pelo direito à indignação, mas não temos direito à resignação.
Acreditamos em nós e em si: na nossa capacidade de fazer algo diferente; na sua vontade de ler e no nosso gosto de escrever, de ir à procura de notícias, de contar episódios e lembranças, de analisar, comentar, criticar tudo o que vemos e ouvimos, com lealdade, com verdade e com o desejo de esclarecer e de ser útil.
Não sei se, no mundo de hoje, está ou não tudo inventado. Mas não está, certamente, tudo re-inventado. Queremos um jornal que seja uma placa giratória de temas, ideias e opiniões, de pessoas dos mais diversos quadrantes, gente famosa e anónima, homens e mulheres próximos ou distantes daquilo a que se chama a Grande Imprensa.
«Jornada». No local em que escrevo, aqui à Av. Rio de Janeiro, em Alvalade, viveu José Gomes Ferreira, escritor, poeta, até músico. Entre as muitas obras de Fernando Lopes Graça musicadas sobre poemas de Gomes Ferreira há uma, talvez a mais conhecida, chamada «Jornada». Começa assim: «Não fiques para trás, oh companheiro».
Companheirismo: também é disto que trata esta missão de jornalistas que, como escreveu um dia Alfredo Farinha, com quem tive o prazer de trabalhar e aprender, «é ir à procura da vida no meio da vida, ir ao encontro do acontecimento onde ele aconteça, conhecer os problemas dos homens, devassar os segredos das coisas desconhecidas e saber a razão dos êxitos e dos fracassos da sociedade».
Foi, portanto, na casa em que viveu Gomes Ferreira que nasceu a «Jornada».
Será longa esta jornada, por vezes juncada de escolhos. É preciso coragem para continuar a caminhar num país parado. É preciso teimosia para se ser feliz num país triste. Acreditamos que o trabalho sério pode ser divertido. Queremos que, ao pegar neste novo jornal, se divirta a lê-lo ou a folheá-lo como nós nos divertimos a fazê-lo. E que pense e contribua. Que isto seja um diálogo e não um monólogo.
«You’ll never walk alone», cantam os adeptos do Liverpool. Quem já os ouviu, em Anfield, sabe como é arrepiante. Como nunca a dupla Rodgers e Hammerstein, que compôs, em 1945, o tema para o musical «Carousel» o terá provavelmente imaginado.
«Porque nenhum de nós anda sozinho/E até mortos vão ao nosso lado», canta-se em a «Jornada» de Gomes Fereira/Lopes Graça. E o poema foi, também ele, escrito em 1945.
Há sempre momentos em que o futebol e a vida se confundem.
Não andaremos sozinhos. Contamos consigo!
Afonso de Melo