"Poderia começar por qualquer outra. Esta é uma cidade de encanto, como de encanto são todas as que reúnem gentes com vida, que criam sua alma e seus encantos guardam, fazem sua e dos seus a história de uma vida, de uma vida com histórias. De futebol também!
Começo por ela porque a esta cidade pertenço, é minha e dela sou, por mais que viva fora ou morra longe!
Nos idos de sessenta, década que me viu chegar e por onde passeei os anos da minha infância e escola primária, o panorama do futebol em Lisboa, como aliás no resto do País, via nascer, explodir e ganhar contornos de mito um senhor chamado Eusébio da Silva Ferreira. Todo o endeusamento o ‘ Pantera Negra ‘ justificou, oferecendo títulos, golos inimagináveis, fotos de uma vida, ‘ petardos ‘ que seriam sua imagem de marca, culminando com um conto de fadas tornado realidade quando em Julho de 1966 e depois de facturar por duas vezes ao Deus Brasil, nos oitavos-de-final do Mundial de Inglaterra, pegou em si mesmo e numa nação atropelada três vezes por uma espécie de David norte coreano, transformando uma inevitabilidade noutra inevitabilidade: 0-3 em 5-3, quatro golos do Rei.
Tudo isto fez com que nas escolas primárias de toda a cidade, no crucial momento de ouvir o coração e jurar o amor eterno, houvesse uma alternativa à magia dos ‘ Cinco Violinos ‘ que tanta alma haviam vestido de verde e branco no final da década de quarenta. Um pouco antes, em 1946, três senhores com os nomes Capela ( guarda-redes), Vasco e Feliciano - à história passados como ‘ as três torres de Belém’- haviam puxado para as cores da ‘ religião ‘ azul e sua Cruz de Cristo, uma série de crentes em dia de votos eternos. Eternos porque .... de Clube NUNCA se muda !
Explica este intróito um pouco das movimentações dos ‘ alfacinhas ‘ em dia de missa e romaria ao estádio. E se a ida à igreja manteve inalteráveis os seus horários, os tempos modernos de imposições e horários televisivos tornou inviável a saída directa de uma para outra devoção. Separando no tempo os acontecimentos de cada tribo e sua cor, transformou um espaço de romarias simultâneas num de peregrinações dispersas por um período que pode ir da noite de 6ª feira até à de 2ª. Em Lisboa e no ‘seu’ futebol, passámos a ver os magotes de gente em comunhão e irmandade com o mesmo emblema, a encher o trajecto até ao estádio, local de culto, com bandeiras, cachecóis - os mais precavidos com a almofadinha para ter um conforto extra no lugar onde sentados iam em busca do seu quinhão de felicidade extra semanal - sem se cruzar e ou dividir cânticos e vivas de apoio.
Desde sempre, de então e até hoje, sentem as sete colinas correr nas suas veias almas de azul e amarelo a circular na Tapadinha do eterno Atlético, de grenat na banda Oriental e seu histórico COL - onde a concentração se faz em tascos com alma e à frente de uma imperial se impõem tácticas e previsões. Pelos lados do Restelo os apaniguados têm garantida uma ida aos pastéis e um estádio com uma paisagem de poesia. Nos bairros daqui e dali, em campos da bola onde habitam clubes de gente imensa e de trabalho, de Palma a Camarate, da Musgueira a Campo de Ourique e outros tantos mais, enchem-se as tardes de cores e credos vários, ganha-se palmo a palmo a sobrevivência ou uma subida de divisão. Por ironia, numa Circular prevista para poucas paragens e estacionamentos, acontece o encontro e paixão de dois emblemas que não se esgotam nem por ali, nem pelas fronteiras do País. O verde e o encarnado da própria bandeira, dividem-se em dois mundos de paixão inigualável no País. Quando se encontram, entende-se a força e profundidade de um termo que qualquer miúdo entende : o derbie !! Um Benfica – Sporting é um momento da mais pura paixão em Lisboa. No País. Nas ex-colónias. No mundo. Onde há gente portuguesa !! Lisboa torna-se assim mais Lisboa !" [Um texto (catrapiscado de A Jornada) de João Pais, mais conhecido por Jan Jan, portanto, oliveira. Para além disso é também um texto sobre as memórias, as memórias dos bairros e do futebol.E o que a mim - apaixonado pelo pontapé na bola nos tempos da minha juventude mas feroz crítico do peso que o futebol tem em todas as esferas da nossa vida politica e cultural - me dizem as memórias dos jogos de futebol que assisti nas manhãs de domingo, no campo da Almada Negreiros ou no Pote de Água!!!]
quinta-feira, 19 de junho de 2008
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13 comentários:
e aí está como é possivel misturar a paixão pela n/cidade, com a paixão da vida, com a paixão do futebol, sem fanatismos, ou melhor, apenas com o fanatismo da paixão.
(eu já ia reclamar, mas vá lá, depois li a nota final, e pronto, se o João Pais é dos Olivais pode entrar, pode entrar ... e agora vou de mansinho antes que entre aí algum/a anónimo/a)
...é dos olivais mas se vivesse cinquenta metros ao lado já era de chelas.
e tu também ó fulacunda!
(eu a esquivar-me dos anónimos e fui logo abalroado por um chaimite. isto tambem já é azar)
Chaimite, se eu vivesse 50 metros ao lado dormia na casota dos fricks do nº 3. e se fossem 100m acabaria na bagageira de um opel, do outro lado da avenida. Se fossem 300m comeria numa mesa do laboratório do ISEL, e mesmo que fossem 500m só apanharia mato onde por vezes pastariam burros chamaria Celestinos. Ao menos sê rigoroso!
E isso que importa para aqui. Os Olivais estão no espírito e no cimento da infância (como a tua), não nas coordenadas do GPS.
Mais do que Fátima, mais do que o Fado, é o Futebol que está no coração de todos (com excepação de poucos e, dentro desses poucos, alguns pseudo-intelectuais manientos que dizem que o futebol é o ópio do povo--mas que, ainda assim, ainda lêm às escondidas a Bola ou o Record). Compreender o fenómeno é um case study...e não é só cá. Gosto de futebol. Aprendi a gostar na minha antiga casa dos OLivais, numa época em que nos reuníamos para ver ou derbies ou alguns europeus...Em miúda ia mais pelo badmington, nunca me esquecerei das tardes passadas no D. Dinis a jogar badmington no campo ao ar livre...Hoje em dia, só perco um jogo importante se de facto, não puder ver. (não tenho tempo para ver todos)...E hoje, aqui estou. À espera do JOGO!
ópio? eu acho que é mais para os lados da família do xámon, num produto muito rechumengado, em dias de grande escassez lá para os lados dos candeeiros...
pois, maria correia, case studemos, case nã studemos...que a mim parece-me que enquanto não houver provas de aferição em futebolês um tipo em junho, estamos no pico dos arraiais, por-se a estudar o futebol tem de ser muito pseudo-fanático, isto para não falar já nas manias, ehehehehe...
Who are you JB Agora A Fazer de Pseudo Intelectual Anónimo Disse?
Eu só disse que era um case study, não que seria para estudar agora...Talvez depois de acabar esta tradução do Chomsky...
joão belo ..... obrigado por catrapiscares a coisa lá do Jornada .. reli aqui e pensei que ia levar uma carga de porrada, e agora depois deste comment meu tenho a certeza que vou, que sim, que a mereço ... falei de bairros aqui e ali ... e não mencionei o bairro mor da Cidade e meu coração ...os Olivais !
Porquê? .. perguntar-me-ão todos, anónimos puros, manientos ou a fazer de intelectual ...
... não sei, ou melhor sei e não sei o que seja melhor, saber ou não saber ... na ânsia de não resvalar para a parte individual, depois do hercúleo trabalho de escrever o texto e não deixar vir ao de cima o meu Benfiquismo, porque o texto é sobre a Cidade e seu Futebol e não sobre paixões irracionais, nessa ânsia de me manter distante, não quis referir com realce o nosso mundo Olivalense ....
... olhando agora à distância .... sinto que deveria tê-lo feito ...
Posso a TODOS pedir desculpas pela omissão .... não significando tal que não deixe aqui o lombo para tanta e merecida porrada ??
Pois...por está desculpado, Bafatá...bem procurei o nome dos Olivais entre os de Restelo, Camarate, Campo de Ourique...mas não faz mal. É um belo texto sobre a cidade ao futebol.
Tropecei neste blog enquanto andava à procura de informações e pessoas da minha infância passada obviamente nos Olivais! Talvez por alguma atracção fatal voltei para cá e feitas bem as contas só estive fora do bairro 3 anos. Mas ando a tentar encontrar informações sobre o Colégio dos Olivais, seus alunos entre 1969/1974 e uma muito especial professora à qual chamávamos de Cilinha. Oliveiras por aí perdidas têm algo para me contar? Sabem onde posso pesquisar mais informações sobre os nascidos e criados nos Olivais? E ainda vou querer saber muito mais... tenho uma ideia que gostava que visse a luz um dia
E desculpem-me a pergunta mas que é A Jornada? é que esse João Pais mais conhecido por Jan Jan faz parte dos meus amigos de adolescência!!
boguinha, ao João Pais, se o procurar bem, pode encontrá-lo por aqui. gente do colégio dos olivais entre 69/74 encontrará aqui certamente um. (a professora que então melhor me lembro era a mariazinha, depois minha vizinha da casa em frente, mão de outra oliveira de gema tb aqui já várias vezes recordada)
pena a boguinha não ter link, gostava de saber quem é. :(
eu andei no colégio dos olivais entre 69 e 74 e fui aluna da cilinha.
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